
582
Estava uma árvore no mesmo lugar onde sempre estivera, à beira de uma estrada, quando um homem se acercou dela e lhe disse sem mais:
— As árvores são todas iguais, mesmo nas suas diferenças: tronco, folhas e uma imobilidade sempre verde. Como é que se pode viver assim?
A árvore pensou um pouco e respondeu-lhe:
— Estás na minha sombra, mas não a aprecias, e logo, logo, irás embora. Assim vive o homem, correndo de um lado para o outro e nunca estando contente com a vida que tem.
O homem não respondeu, parecendo só então sentir a sombra fresca e olorosa e, por breves instantes, a sua boca desenhou um sorriso de felicidade. Mas logo se foi embora dizendo a si mesmo que era tempo de se fazer à vida.
583
Estava um camaleão em cima de um arbusto, calmamente se confundindo com ele, quando um homem que por ali passava lhe disse:
— Que ridículo és, com os teus olhos desencontrados e a tua mania da imitação.
E riu-se muito, às gargalhadas.
O camaleão empalideceu um pouco, mas olhou-o nos olhos e disse-lhe:
— Eu não sou um camaleão, mas sim o camaleão, um animal perfeito na sua satisfação de si. Agora tu, és apenas um homem, e tenho a certeza que nem sabes em ti aquilo que te faz homem. Triste e trágica criatura és tu, condenado a nunca saberes realmente quem és.
O homem não disse nada, mas ficou muito tempo a pensar no que ouvira antes de seguir o seu caminho.
Há quem diga que se tornou um homem melhor.