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Dois escritores, um bom e outro mau, foram inseparáveis em vida, e nunca se conseguiu afinal descobrir qual era um e qual era outro. Como não podia deixar de ser, ambos escreviam, ou não seriam escritores, mas quanto à respectiva qualidade literária as opiniões dividiam-se e contradiziam-se. E o mesmo se diga das vendas, pois embora um deles vendesse muito mais do que o outro, desse facto ninguém conseguiu alguma vez extrair uma conclusão definitiva. A dúvida subsistiu mesmo depois de mortos, e a única certeza que hoje se tem é que ambos eram escritores, um bom e outro mau.
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Era uma vez um homem que se interrogava muitas vezes se seria afinal um escritor, e nunca nem uma vez lhe passou pela cabeça que tal era tempo perdido, pois ou bem que se é ou não se é, e pensar sobre isso de pouco adianta. Talvez o caminho mais fácil seja acreditar-se que se é, porque é sempre a nós que cabe a última palavra, sobretudo quando se é escritor. Se queres ser escritor, disse o homem a si mesmo, escreve, é a única certeza que alguma vez podes ter. E foi o que fez. A sua obra prova-o.
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Era uma vez um homem que se interrogava muitas vezes se seria fácil ou difícil nadar, e assim pensando ia adiando afinal a sua primeira vez. Aconteceu no entanto que passeando certa vez ao longo do rio, depois do almoço, bem comido e melhor bebido, tropeçou e caiu à água sem apelo nem agravo. Quando o retiraram do rio, dois quilómetros mais à frente, já estava morto. Ainda deu umas braçadas, disse quem assistiu, mas de nada lhe serviram, pois morreu afinal de congestão, que a morte não é esquisita e de certeza não pensa duas vezes antes de agir.