150.
Certo homem adoeceu gravemente e um dia as dores eram tão fortes que várias vezes chamou pela morte. Por isso não ficou surpreendido quando ela chegou, nem mesmo quando lhe estendeu um apetitoso morango. Agarrou-o com cuidado. Como era vermelho e doce o seu sabor.
149.
Vivia há muito tempo longe do mundo, no entanto o mundo não deixava de vir até ele. Ninguém o tinha ouvido pronunciar uma única palavra, mas vinham de muito longe para lhe pedir orientação. Ele limitava-se a escutar, primeiro as perguntas, depois as respostas, sempre tranquilo e silencioso. O seu rosto ostentava às vezes um leve sorriso. Todos o consideravam um homem santo e sábio e a sua fama estendeu-se cada vez mais. Por estranho que pareça ninguém pensou que ele não podia falar. E muito menos que não os pudesse ouvir. Continuaram a procurá-lo e a encontrar plena satisfação.
148.
Foram ontem lançados, pela manhã, dez mil balões brancos, um por cada aluno, em memória do estudante assassinado há dois anos. Não se sabe quantos pessoas assistiram mas foram muitas, mais do que os balões. O morto, infelizmente, não estava presente. O assassino também não, caso estivesse teria pensado mais uma vez no número de dias em que foi condenado, apenas ligeiramente inferior ao número de balões lançados. Por outro lado, a pena aplicada era mais velha que o condenado à altura do crime. Tudo é relativo menos a morte.
147.
Certo homem pensou que estava preparado para se virar seriamente para dentro de si. Mas a imaginação é uma estrada perigosa que ora nos afasta ora nos aproxima de nós, e quem nela se aventure precisa ter todo o cuidado e nunca esquecer quem é, ou o mais certo será que fique fora de si. Foi o que lhe aconteceu.